Hoje em dia, é raro encontrar boas costureiras como antigamente. Aquelas mãos habilidosas que transformavam tecidos em histórias, capazes de criar, ajustar e reparar com precisão e afeto. Pior ainda: a palavra “costureira” parece ter se tornado sinônimo de algo ultrapassado. Muita gente até sente vergonha de ser chamada assim. Mas eu, não. Eu faço questão de me apresentar como costureira.
Ser costureira é carregar um legado. É entender o valor de cada ponto, de cada costura bem-feita. É ter orgulho de dominar uma arte que vem sendo esquecida em meio à pressa do mundo moderno e à lógica da produção em massa.
Por muito tempo, a costureira esteve presente em quase todas as famílias, em cada bairro. Era uma profissão passada de mãe para filha, exercida majoritariamente por mulheres — como ainda é hoje: 87% dessas profissionais são mulheres. No entanto, o que antes fazia parte do nosso cotidiano foi sendo empurrado para os bastidores, para a informalidade, para a invisibilidade.
Entre 2010 e 2020, a Abit registrou uma queda de 32% nos empregos formais no setor do vestuário. E mesmo sem dados específicos sobre as costureiras, sabemos que a informalidade sempre esteve presente. A maioria de nós trabalha em casa, de forma autônoma, sem registro, contrato ou reconhecimento. Segundo um levantamento da ONU de 2022, 62% das costureiras brasileiras atuam em casa, e 51% são autônomas.
É contraditório: mesmo sustentando a base da moda, somos constantemente esquecidas. Nossos nomes não aparecem nas etiquetas, nossos rostos não estão nas campanhas, nem nas mesas de decisão. E, ainda assim, seguimos costurando o que os outros vestem. Seguimos invisíveis.
Essa realidade dói. Porque, como estilista — e principalmente como costureira — vejo de perto o apagamento dessa profissão. E me pergunto: até quando a moda vai continuar silenciando quem realmente faz?
Recentemente, li uma frase que me tocou profundamente:
“Enquanto o mundo se rende à velocidade da produção em massa, a costura artesanal ressurge como um grito silencioso de resistência…”
Essa reflexão me fez lembrar da importância do que faço — e do que tantas outras mulheres fizeram antes de mim.
Costurar não é apenas unir tecidos. É resgatar uma relação com o tempo, com o cuidado, com o detalhe. É desafiar um sistema que valoriza o novo e o descartável, em vez daquilo que carrega história, afeto e durabilidade.
A arte da costura está em risco de desaparecer — e justamente por isso, precisa ser valorizada. Precisamos reconhecer a costureira como artista, como profissional essencial para um futuro mais consciente, criativo e sustentável. Costurar é resistir.